O que são
estrelas binárias eclipsantes?
O céu a noite
fascina o ser humano desde os primórdios da civilização. Um céu estrelado a
noite faz qualquer pessoa se maravilhar com a beleza do brilho das estrelas,
até mesmo aqueles que fazem pouco caso de parar e olhar para cima em um dia de
noite com céu limpo. O que poucos sabem é que a maioria daqueles pontinhos
brilhantes, são na verdade duas ou mais estrelas orbitando uma a outra, bem
próximas (do ponto de vista astronômico), e devido as distancias até a Terra, a
luminosidade das componentes do sistema se misturam e não podemos perceber tão facilmente.
Pesquisas desde o século XIX nos fornecem informações de que muitas dessas
estrelas fazem parte de um sistema deste tipo. Esses sistemas são chamados de
sistemas binários ou múltiplos.
Para este artigo,
vamos nos ater somente a sistemas binários ou popularmente conhecido como
estrelas binárias, pois, são a essas estrelas que muitos observadores de
estrelas variáveis dedicam seus trabalhos. Estrelas binárias, normalmente,
compõem um sistema no qual uma componente é uma estrela com massa muito maior
(estrela A) e outra com massa menor (estrela B) e apresentam uma característica
bem interessante para observadores aqui na Terra.
Existe uma
definição importante quando se ler e se estuda sobre estrelas binárias, é o
conhecido Lobo de Roche. Em um sistema binário, existem duas estrelas com
campos gravitacionais altíssimos em interação, você deve lembrar de suas aulas
de física que em campos gravitacionais existem regiões de equipotencial, ou
seja, regiões ao redor de um corpo massivo que apresentam a mesma medida para a
força gravitacional. Agora vamos imaginar nosso sistema binário de estrelas,
cujos campos gravitacionais se “misturam”. Com toda certeza ainda existem
pontos de equipotencial ao redor deste sistema, porém, agora devido a soma
desses potenciais gravitacionais haverão regiões críticas em que os potenciais
das duas estrelas se anulam. A figura 01, detalha um pouco sobre essas regiões:
Como podemos perceber, os pontos L1, L2 e L3 apresentam-se como os pontos críticos nesta
ilustração. Mas vamos observar com mais atenção o ponto L1, pois nessa região
passa o equipotencial, que, quando a estrela expande sua superfície até esse
ponto, ela transfere massa para a sua companheira e esse equipotencial que
passa pelo L1 que chamamos de Lobo de Roche. Existe uma
classificação de estrelas binárias quanto ao Lobo de Roche são elas: binário
destacado, binário semi-destacado, binário de contato e binário de contato
saturado.
1)
As binárias destacadas são
sistemas em que as estrelas estão completamente dentro de seus Lóbulos de Roche
e podemos observa-las separadamente a uma certa distância uma da outra:
2)
As binárias semi-destacadas apresentam
uma de suas componentes preenchendo todo o Lobo de Roche, o que acarreta uma
transferência de massa para a estrela menor:
3)
As estrelas binárias de contato são
sistemas em que as duas estrelas preenchem completamente o Lobo de Roche,
podendo haver assim uma transferência mútua de massa entre as estrelas. Esse é
um tipo bem raro de se encontrar, pois existem condições muito específicas para
que essa configuração aconteça:
4)
A última classificação é o modelo mais comum de
se encontrar no universo, são as binárias de contato saturado. Nesses
sistemas, as estrelas expandem suas superfícies para além do Lobo de Roche,
transferindo massa e energia pelo ponto L1.
Para as
estrelas deste sistema, em uma situação em que estejam orbitando no mesmo plano
de visada do observador, pode ser observado um bloqueio da luminosidade medida
aqui na Terra, pois, quando uma das estrelas atravessa a frente de sua
companheira, parte da luz da estrela eclipsada é bloqueada, o que gera uma variação
no seu brilho, ou em termos mais técnicos, na sua magnitude. Essas por sua vez,
são conhecidas como binárias eclipsantes, variáveis eclipsantes ou binárias
fotométricas. Abaixo podemos ver uma animação de como os eclipses acontecem:
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=199420
A variação na magnitude de algumas binárias eclipsantes pode ser facilmente observada visualmente e com o auxílio de um pequeno telescópio ou um binóculo. Essa variação também pode ser medida utilizando-se de métodos indiretos como a espectroscopia e a astrometria. Mas, qual a importância de observar essa variação de brilho dessas estrelas? Pois, bem, com as observações sistemáticas dessas estrelas é possível obter uma curva de luz (gráfico no qual se mostra a variação de magnitude ao longo do tempo) característica desses objetos e como o que causa a variação é a passagem de uma estrela na frente da outra, isso está intimamente ligado ao seu período orbital, o que resulta em um gráfico com intervalos entre os eclipses bem definidos, podemos assim, estimar quando acontecerá o próximo eclipse. Os cálculos dessas órbitas podem nos dar informações sobre a massa de cada uma das estrelas, o raio de cada uma e a densidade das estrelas. Esta parte ficará para um artigo futuro aqui no blog.
Alguns tipos
curiosos de variáveis eclipsantes
1. Algol
Esta estrela eclipsante binária é também
conhecida como beta Persei. O que nos chama a atenção para essa estrela é que
ela serve como base para todas as variáveis eclipsantes. Nestes sistemas
binários, as duas estrelas estão a uma certa distância de tal maneira que as
variações podem ser facilmente percebidas a olho nu e os eclipses podem ser
notado facilmente nos gráficos de curvas de luz. Outro fato interessante dessas estrelas é que
a diminuição do brilho ocorre a cada 3 dias e duram no decorrer de horas. A ilustração abaixo facilita nossa percepção de como é o sistema beta Persei:
Nestas variáveis, o eclipse primário, que
é quando ocorre da componente menos brilhante passa na frente da componente
mais brilhante, ela apresenta uma amplitude bem maior que o eclipse secundário,
detalhe que em outros sistemas binários nem se percebe. A variação na sua
magnitude pode atingir a casa de quatro magnitudes, como por exemplo o sistema
RW Tauri, outro detalhe interessante é o período que em alguns casos,
dependendo da distância entre as componentes do sistema, varia de um dia a
anos.
Caso haja interesse por essa variável
eclipsante, segue uma carta de observação fornecida pela AAVSO e como ela pode
ser facilmente observada a olho nu, já servira para aprimorar suas habilidades
na observação.
2. Ursae Majoris
Esse outro tipo
bem curioso de sistema binário é também conhecido como binário de contato de
baixa massa. Essas estrelas estão tão próximas que há um compartilhamento de
matéria e energia de uma estrela para outra através de uma espécie de pescoço
de conexão. Essas estrelas são constantemente distorcidas pela gravidade uma da
outra, o que provoca uma variação de brilho além da observada nos eclipses. Abaixo podemos ver uma curva de uma estrela do tipo W Ursae Majoris, um subtipo das estrelas Ursae Majoris
Os períodos desses sistemas podem variar de 0.22 a 0.8 dias, período bem curto comparado às outras estrelas do tipo binária eclipsante, isso se dar pelo fato de as estrelas estarem bem próximas, em contato, e orbitarem entre si em intervalos bem curtos de tempo, o que acarreta intervalos de eclipses bem pequenos.
Para os
curiosos que quiserem observar este tipo de estrela, abaixo há uma carta de
observação da estrela ε CrA, na constelação de Corona Australis. Essa estrela
varia de 4,74 a 5 magnitudes em um período de 0.6 dias.
3.
QX Cas
QX Cas é um sistema de eclipsantes
binárias do tipo |Algol, porém há duas características bem interessantes sobre
esse sistema. A primeira característica é que o período entre seus eclipses é
de 6.00471 dias, esse número tão próximo de ser inteiro, deixa bem defino que
se o eclipse ocorrer ao meio dia do 01 de julho, por exemplo, ele voltará a
ocorrer no meio dia no dia 07 de julho, porém, a quase 7 min mais tarde.
A segunda característica é que esse
sistema deixou de apresentar eclipses para os observadores aqui na Terra, mas
não porque as estrelas pararam de orbitar e sim devido aos movimentos de
precessão das estrelas componentes que fizeram com que o sistema tirasse sua
orbita do plano de observação daqui da Terra. E o mais interessante é que esse
“sumiço” foi observado ao longo dos anos, como mostra a ilustração abaixo, no
qual podemos perceber que com o passar dos anos, a intensidade dos eclipses
foram diminuindo até não haver mais. Eis aqui um belo exemplo do quão é
importante arquivar as observações dessas estrelas:
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