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segunda-feira, 13 de abril de 2020

Variáveis do tipo RCB



Introdução

Entre os astrônomos amadores, as estrelas Novas são objeto de grande interesse pelo principal motivo de serem estrelas que tem um abrilhantamento efêmero e, sendo assim, as observações se revestem de uma singularidade única e não repetitiva, na maioria dos casos. As ditas estrelas Novas apresentam um aumento de brilho de várias magnitudes repentinamente, em questão de um dia ou mais, quando se encontravam anteriormente em brilho estável.

Entretanto, uma outra classe de estrelas apresenta um comportamento inverso ao das Novas - por isso são chamadas também como Novas reversas. São estrelas variáveis que caem de brilho repentinamente - algumas diminuem mais de 10 magnitudes - e esta queda ocorre em questão de poucos dias e de uma maneira  imprevisível. Estas variáveis atraem a atenção de muitos astrônomos amadores, que as observam dia após dia, na expectativa de testemunhar  as chamadas 'crises de brilho', que são os episódios de enfraquecimento súbito de brilho.

Estas estrelas são chamadas variáveis do tipo R Coronae Borealis - RCBs.

São assim conhecidas em homenagem à primeira estrela deste tipo a ser descoberta, no ano de  1795, pelo astrônomo inglês Edward Pigott .


Quantas são

Atualmente são conhecidas apenas cerca de 150 variáveis deste tipo na nossa Galáxia e  algumas nas Nuvens de Magalhães, enquanto a expectativa é de que existam  pelo menos 1000 exemplares na Via-Láctea. As RCBs ainda não descobertas podem estar do outro lado da nossa Galáxia e, portanto, dificilmente serão observadas, pelo menos com a tecnologia atual.

É uma classe de estrela muito rara pois o estágio evolutivo em que se encontram dura pouco mais de dez mil anos.  Antes do início da prospecção de estrelas com a utilização de satélites ou instrumentos remotos e da fotometria automatizada, eram conhecidas  apenas cerca de 50 variáveis RCB - até meados da década de 70.

A constatação de que uma determinada estrela pertence ao tipo RCB demanda análise de observações anteriores, portanto da curva de luz, e também de suas características espectrais.  Uma queda súbita de brilho e recuperação rápida, se não forem observados  mais episódios semelhantes, não são suficientes para classificar a estrela como RCB. Variáveis Algol de longo período – como BL Telescopii e OW Geminorum - apresentam comportamento semelhante e só com observações continuadas foram reconhecidas como tal.


Não existem duas RCBs semelhantes; aliás, estrelas variáveis pertencentes a uma mesma classe ou tipo sempre apresentam peculiaridades próprias que as tornam únicas.

Sua observação continuada e persistente se torna de grande interesse para o melhor conhecimento destes objetos, e a participação do astrônomo amador atento é de grande valia para a comunidade científica. Comportamentos atípicos em algumas destas estrelas, como queda de brilho em patamares abaixo do previamente conhecido, se constituem em fatos novos anteriormente não percebidos.

A maioria das RCBs adicionadas recentemente aos catálogos e glossários de variáveis, como o Variable Star Index, possuem magnitudes muito fracas, mesmo no máximo brilho, ou então não possuem uma amplitude notável, o que torna a observação destes exemplares adequada a observadores muito experientes e com instrumentos de grande porte.

Características

As variáveis RCBs são estrelas supergigantes amarelas, de tipo espectral variado, principalmente F e G,  em sua maioria. Suas atmosferas são pobres em Hidrogênio e abundantes  em Carbono e Nitrogênio.

Acredita-se que as quedas  de brilho são causadas pela erupção de material carbônico vindo do interior da estrela e que passa orbitar o astro, obscurecendo seu disco estelar e, por conseguinte, diminuindo seu brilho aparente. Medidas realizadas no comprimento de onda infravermelho demonstram que não há mudança de brilho da estrela por baixo da fumaça de carbono, exceto variações devidas ao seu movimento cíclico  pulsatório.

Alguns estudos indicam que esta nuvem de fumaça situa-se na fotosfera da estrela enquanto outra teoria sugere que ela se situa a uma distância de 20 raios estelares. À medida que esta nuvem de carbono se dissipa, a estrela recupera seu brilho original. Algumas crises de brilho podem durar anos ou mesmo décadas, e a amplitude variação de brilho também não é sempre a mesma.

A maioria das RCBs apresenta, fora das crises de brilho, uma variação  cíclica que se parece com o tipo das cefeídas. RY Sagittarri,  por exemplo, varia entre mag. 6.3 e 6.8 a cada 38 dias.


Existem atualmente duas teorias para explicar o estágio evolutivo das estrelas RCBs.

Uma, bastante exótica,  sugere que estas estrelas são resultado da fusão de duas estrelas anãs-brancas.

Uma outra teoria sugere que se tratam de objetos que evoluíram  a partir do estágio de estrela central de uma nebulosa planetária em direção a uma fase efêmera de supergigantes, classificada como ‘final helium shell flash’.  De acordo com um estudo recente, a variável FG Sagittae seria um notável exemplo de estrela atravessando esta transição durante nossa existência, bem como também  a V4334 Sagittarii, conhecida como objeto Sakurai.

De todo modo, é possível que a diversidade de estrelas RCBs seja consequência de uma variedade de mecanismos em sua formação, ainda não totalmente entendidos pelos estudiosos.

A seguir, segue uma lista de estrelas RCB interessantes para o acompanhamento visual.


R Coronae Borealis

Foi descoberta por Pigott em 1795. Em seu máximo brilho esta estrela se situa em torno de 6ª. magnitude e durante as crises de brilho pode cair até a 15ª. magnitude. Pode ser observada com  binóculo em sua fase normal.


No gráfico acima pode-se verificar a famosa crise de brilho que se iniciou em 2007, durando quase oito anos. Somente em 2014 a estrela começou a se recuperar em direção ao máximo, ficando ali por alguns meses e caindo novamente de brilho. Os pequenos pontos em forma de triângulo invertido significam observações negativas (estrela abaixo do limite instrumental)  Cortesia AAVSO.

RY Sagittarii

A confirmação de que RY Sgr era uma variável foi anunciada em 1896 por Edward Pickering, após suspeitas levantadas por J. C. Kapteyn e estudos realizados pelo coronel Markwick e pela senhora Williamina Fleming, de forma independente. Em seu máximo brilho , RY Sagittarii pode ser observada com binóculo, que será suficiente para perceber variações cíclicas nesta estrela da ordem de meia magnitude.

Durante os últimos dez anos RY Sgr permaneceu inativa e sem crises, e os aficionados por esta estrela já estavam imaginando que uma crise iminente poderia começar a qualquer momento.

Subitamente, em outubro de 2019, sua queda de brilho foi percebida por alguns observadores, entre os quais o brasileiro Alexandre Amorim, que comunicou o fato à AAVSO.


Na curva de luz acima, relativa aos últimos 82 anos, vemos diversas crises de RY Sagittarii e percebe-se a queda sempre abrupta no seu brilho e a recuperação se dando de forma mais gradativa, com idas e vindas. Cortesia AAVSO.


V854 Centauri

Inicialmente denominada de NSV 6708, esta brilhante estrela austral do tipo RCB passou despercebida durante mais de século, sendo somente identificada como tal no ano de 1986 pelos astrônomos Mc Naught & Dawes.

Placas fotográficas de patrulha de Harvard, obtidas entre 1913 e 1937 sugerem uma sucessão de crises de brilho superpostas. Embora não haja muitos registros de brilho desta estrela anteriores à sua descoberta, acredita-se que seja uma variável RCB muito ativa, tendo passado longos períodos muito fraca em brilho. Talvez esta seja uma das razões de não ter sido notada anteriormente.

V854 Centauri é a terceira estrela deste tipo mais brilhante no firmamento, ficando atrás somente de R CrB e RY Sgr. Em seu brilho máximo, esta variável se situa em torno da sétima magnitude e durante as crises de brilho pode cair até a 15a. mag.


Curva de luz da então NSV6708 desde 1987. Percebe-se a grande atividade desta RCB, com sucessivas crises de brilho, na maioria ultrapassando a 14ª. magnitude. A recuperação de brilho é igualmente rápida. Cortesia AAVSO.

UW Centauri

Esta é uma RCB austral situada próxima ao  braço esquerdo do Cruzeiro do Sul, portanto fácil de ser encontrada. Em seu máximo situa-se em torno da 9ª. magnitude. Quando cai de brilho, pode chegar à 17ª. magnitude, estando, portanto, ao alcance apenas de instrumentos de grande abertura nesta ocasião.

A curva de luz acima apresenta a variação de brilho de UW Cen nos últimos cinqüenta anos. Vê-se que é uma RCB muito ativa e que permaneceu em brilho fraco entre os anos de  1997 a 2006. Em junho de 2019 iniciou uma nova crise. Cortesia AAVSO.


S Appodis

Esta é uma variável RCB bastante austral e relativamente brilhante no máximo brilho - 9a. magnitude. Encontra-se em um campo visual de pouca dificuldade, cerca de 3,5° ao sul de gama Trianguli Austrini. Nos últimos 32 anos, por exemplo, S Appodis só experimentou 7 crises de brilho, sendo que a última começou no final de 2018 e terminou em agosto de 2019. No mínimo de brilho S Aps é bem fraca, chegando à 17ª. magnitude.

Curva de luz de S Appodis nos últimos 32 anos. Cortesia AAVSO.


V Coronae Australis

Nos últimos 60 anos V Coronae Australis tem passado por grande atividade, com inúmeras crises, onde chega a quase 17a. magnitude. Desde abril de 2007, esta RCB tem  mantido um comportamento irregular, com uma pequena recuperação em 2010 que durou um ano para se completar. A partir de 2011 caiu novamente de brilho e não retornou até hoje ao seu patamar máximo. Nos últimos anos, as observações visuais tem sido muito escarsas.

Curva de luz de V CrA nos últimos 60 anos. Cortesia AAVSO.

FG Sagittae

Embora não seja ainda considerada uma RCB, esta peculiar variável tem atraído grande interesse dos estudiosos, por se acreditar que esteja numa fase de transição em direção a se tornar uma integrante desta classe. FG Sagittae é a estrela central da nebulosa planetária Henize 1-5 e desde agosto de 1992 vem apresentando sucessivas quedas e recuperações de brilho, atribuídas a emissões de material carbônico, semelhantes às RCBs.

Curva de luz de FG Sagittae desde 1968. Cortesia  AAVSO.

RS Telescopii

Esta variável pode ser observada com pequeno instrumental quando se encontra próxima ao máximo brilho, com magnitude visual de 9.6. Está muito próxima a uma estrela de magnitude 9.5, portanto as estimativas devem ser cuidadosas. A última crise de brilho de RS Tel ocorreu no ano de 2013, quando chegou quase à 15ª. mag. Portanto, pelo histórico de crises, pode ser que a próxima ocorra em breve!
Curva de luz de RS Telescopii desde 1963. Muitos mínimos não foram bem observados. Esta variável tem sido muito pouco observada nos últimos anos. Cortesia AAVSO.



Tabela de RCBs interessantes para o observador visual:








Bibliografia

W.A. Lawson and P. L. Cottrell, The R Coronae Borealis star NSV 6708; Mount John University Observatory, New Zealand

R Coronae Borealis, Variable Star of the month, Kate Davis, AAVSO Technical Assistant, Web - January 2000

Burnhan’s Celestial Handbook, vols. I, II e III, Dover Publications

R Coronae Borealis variable, Wikipedia

Variable Star Index, AAVSO

FG Sagittae: a newborn R Coronae Borealis Star?, Guillermo Gonzalez, David L. Lambert, George Wallerstein, Verne V. Smith e James K. McCarthy

The ever changing circunstellar nebula around UW Centauri, Geoffrey C. Clayton, F. Kerber, Karl D. Gordon, Warrick A. Lawson,
Michael J. Wolff, D. L. Pollacco, and E. Furlan