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terça-feira, 17 de janeiro de 2023

Telescópios Espaciais em Operação – parte 2

(este artigo foi elaborado por Ari M. Siqueira e postado por Marcos Silva, por questões técnicas momentâneas)

Neste segundo capítulo da série sobre telescópios espaciais, examinaremos os telescópios capazes de registrar as emissões de mais alta energia do Universo, a Radiação Gama e os Raios X, e como os astrônomos amadores podem utilizar os dados de suas observações.

Os Raios Gama são radiações eletromagnéticas com frequências acima de 3×1019 Hz (30 exa hertz) e energia superior a 100 keV, com comprimentos de onda menores do que 10 picômetros (pm, 10-12 m). (1)

A faixa de frequência e energia dos Raios Gama não possui um limite superior bem definido. Os Raios Gama que alguns sistemas como o Cherenkov Telescope Array Observatory (CTAO) poderão detectar são cerca de 10 trilhões de vezes mais energéticos do que a luz visível. (2)

Nota: Os Raios Gama que o CTAO detectará não chegam até a superfície da Terra pois interagem com a atmosfera, produzindo cascatas de partículas subatômicas e criando um flash azul de “luz Cherenkov”. Através do ar, a luz viaja 0,03% mais devagar do que no vácuo. Assim, através da atmosfera, essas partículas de energia ultra-alta podem viajar mais rápido que a luz. Embora a radiação Cherenkov se espalhe por uma área de cerca de 50.000 m2, a cascata dura apenas alguns bilionésimos de segundo. É muito fraca para ser detectada pelo olho humano, mas não para o CTAO.


O Cherenkov Telescope Arrasy no deserto do Atacama, Chile.

Os Raios X têm comprimentos de onda que variam entre 0,01 e 10 nanômetros e correspondem a frequências na faixa entre 3x1016 Hz (30 petaHertz) e 3x1019 Hz (30 exaHertz), com energias na faixa entre 100 eV e 100 keV e comprimentos de onda entre 10-9 m (10 nm) e 10-12 m (10 pm). (3)  Os comprimentos de onda dos Raios X são, portanto, mais curtos do que os dos Raios UV e mais longos do que os dos Raios Gama. Os Raios X não penetram através da atmosfera, só podendo ser observados na alta atmosfera ou no espaço, o que torna indispensável o lançamento ao espaço de detectores específicos.

Talvez você se pergunte: o que os telescópios espaciais de Raios Gama e Raios X têm a ver com os astrônomos amadores os quais, com seus telescópios ópticos, observam as estrelas através das suas emissões de luz entre 400 e 700 nm (frequência entre 7,5 e 4,3 x 1014 Hertz, energia entre 3,1 e 1,8 eV), que podem ser detectadas pelos nossos olhos e pelos sensores CCD e CMOS comuns, entre o ultravioleta próximo e o infravermelho?

Para responder a essa pergunta, vamos recordar as origens dos Raios Gama e Raios X cósmicos.

Vários tipos de objetos astrofísicos emitem Raios X. (4)  Eles incluem aglomerados de galáxias, buracos negros em núcleos galácticos ativos (AGN), objetos galácticos como remanescentes de supernovas, estrelas e estrelas binárias contendo uma anã branca (estrelas variáveis cataclísmicas e fontes de Raios X super-soft), estrelas de nêutrons ou buracos negros (binários de Raios X).

Os Raios Gama podem originar-se de galáxias ativas, pulsares e remanescentes de supernovas. As fontes mais poderosas dessa faixa espectral de energia eletromagnética são as explosões de Raios Gama (Gamma Ray Bursts, GRBs), eventos imensamente energéticos observados em galáxias distantes. (5) Eles são os eventos eletromagnéticos mais energéticos e luminosos que se conhece. As rajadas de Raios Gama provenientes de GRBs podem durar de dez milissegundos a várias horas. Após um flash inicial de Raios Gama, um "resplendor" de vida mais longa geralmente é emitido em comprimentos de onda mais longos (Raios X, luz ultravioleta, luz visível, infravermelho, microondas e rádio). Exatamente nesse momento é que surge uma excelente oportunidade para os observadores equipados com telescópios ópticos de pequeno porte, ao alcance dos amadores.

Em 25 de julho de 2003, Berto Monard, de Pretória, África do Sul, tornou-se o primeiro astrônomo amador a descobrir o brilho residual visual de uma explosão de Raios Gama. (6, 7) Monard identificou o objeto em seu observatório particular, sete horas após a explosão inicial. Denominado GRB 030725, o evento foi detectado pelo telescópio espacial High Energy Transient Explorer-2 (HETE-2), que imediatamente transmitiu suas coordenadas aproximadas para astrônomos em todo o mundo. A American Association of Variable Star Observers (AAVSO) enviou as coordenadas para seu próprio exército mundial de astrônomos amadores por meio da Rede Internacional de Alta Energia. Monard é um observador ativo de variáveis cataclísmicas e um talentoso astrônomo amador com 10 descobertas de supernovas em seu currículo. Ele recebeu o alerta da AAVSO e foi inspecionar a área de busca de 30 arcmin (minutos de arco), onde a decrescente luminosidade estaria. Equipado com um telescópio Schmidt-Cassegrain de 300 mm de diâmetro e uma câmera CCD, Monard fez várias exposições de 45 segundos e as empilhou digitalmente. Seus esforços revelaram um objeto anômalo muito fraco perto da borda superior da área de busca, na constelação de Virgem, na posição com ascensão reta (R.A.) 20:33:59.47, e declinação (Dec.) −50:40:56.26 (J2000). A habilidade de Monard em superar os profissionais com sua descoberta veio de uma combinação de fatores, entre os quais sua preparação e oportunidade. Sua primeira vantagem foi a localização: GRB 030725 surgiu na constelação do Indo, colocando-o fora do alcance dos instrumentos do Hemisfério Norte. A descoberta também foi feita durante a Assembleia Geral da IAU em Sydney, Austrália, enquanto muitos astrônomos do hemisfério sul estavam longe de seus telescópios. A descoberta de Monard também serviu como uma afirmação da AAVSO High Energy Network. "Este é um exemplo perfeito de uma maravilhosa colaboração profissional", disse à época Janet Mattei, então diretora da AAVSO.

Em 20 de novembro de 2004 o telescópio do Neil Gehrels Swift Observatory (Swift) foi lançado ao espaço. Então, em 30 de março de 2008, a energia luminosa visível emitida um GRB foi detectada por um telescópio amador no Novo México, o Seeing in the Dark Internet Telescope, após a transmissão de um alerta automático que partiu do Swift. O objeto foi designado GRB 030329 e mapeado na constelação do Leão, na posição R. A. 10:44:50.0, Dec. 21:31:17.8 (J2000). (8) 

Neil Gehrels Swift Observatory (Swift)

Outro GRB, denominado 130427A, foi flagrado por um astrônomo amador em 27 de abril de 2013, em Utah, EUA. Patrick Wiggins estava fazendo um rápido lanche enquanto observava o céu com seu telescópio de 355 mm quando chegou o aviso sobre a detecção de Swift. "Achei que já seria tarde demais para visualizar qualquer coisa, mas no momento eu estava focando em um ponto no céu a apenas alguns graus do local informado, na constelação do Leão, R.A. 11:32:33, Dec. +27:41:56. Então redirecionei meu telescópio e fiz uma rápida exposição de 60 segundos. E lá estava ela! Continuei observando até o amanhecer, registrando a queda do seu brilho para produzir uma curva de luz." (9, 10)


Imagem e curva de luz de GRB 130427A produzidas por P. Wiggins. 

Mais recentemente, em 9 de outubro de 2022, ocorreu a detecção do GRB 221009A, também conhecido como Swift J1913.1+1946, uma explosão de Raios Gama extraordinariamente brilhante e duradoura, observável opticamente por mais de 10 horas, também visualizada por astrônomos amadores, na posição R.A. 19:13:03.48, Dec. +19:46:24.6, na constelação Sagitta (Seta), a 2,4 bilhões de anos-luz.

O evento foi tão brilhante que se pensou inicialmente ser um breve flash de Raios X de uma fonte não muito distante. Foi somente através de uma análise mais aprofundada que os astrônomos descobriram a verdadeira natureza do brilho – uma explosão de Raios Gama, uma das explosões mais violentas de que se sabe, embora não se compreenda. Apesar de mais distante do que se julgou inicialmente, ainda foi uma das mais próximos já vistos, a apenas 2,4 bilhões de anos-luz de distância. Além disso, esta emissão de Raios Gama excepcionalmente brilhante parece ter sido a mais potente já detectada, estimada em 18 tera elétron volts (18 x 1012 eV). Desta vez, o destaque foi para o astrônomo amador Filipp Romanov que, operando remotamente o telescópio T24 da rede iTelescope.Net, registrou o optical afterglow do GRB Swift J1913.1+1946 (GRB 221009A). (11, 12) 

Em conclusão: Esses são apenas alguns exemplos da participação de astrônomos amadores, geralmente observadores de estrelas variáveis, na detecção e caracterização fotométrica de eventos astronômicos transitórios e com alta energia, de extrema importância para a Astrofísica.

Atualmente, os seguintes telescópios espaciais capazes de detectar Raios X e Raios Gama oriundos de GRBs e outras fontes de alta energia eletromagnética se encontram em operação (para saber mais sobre telescópios espaciais com detectores de Raios Gama e Raios X, siga os links abaixo ou aguarde o próximo capítulo desta série):

·         Astrorivelatore Gamma a Immagini LEggero (AGILE) – Raios X e Gama.

·         Astrosat – Raios X.

·         Chandra X-Ray Observatory – Raios X.

·         Fermi Gamma-Ray Space Telescope – Raios Gama.

·         Hard X-Ray Modulation Telescope (HXMT - Insight) – Raios X.

·         Imaging X-ray Polarimetry Explorer (IXPE) – Raios X.

·         INTErnational Gamma Ray Astrophysics Laboratory (INTEGRAL) – Raios X e Gama.

·         Monitor of All-sky X-Ray Image (MAXI) – Raios X.

·         Neil Gehrels Swift Observatory – Raios X e Gama.

·         Neutron Star Interior Composition Explorer (NICER) – Raios X.

·         Nuclear Spectroscopic Telescope Array (NuSTAR) – Raios X.

·         Spektr-Roentgen-Gamma/Spectrum X-Gamma (SRG/SXG) – Raios X e Gama.

·         The X-Ray Multi-Mirror Mission (XMM-Newton) – Raios X.


Da próxima vez que você observar os céus com o seu telescópio, permaneça atento a eventuais alertas para a ocorrência de súbitas emissões de Raios Gama ou Raios X. Você poderá ser o próximo astrônomo amador e o primeiro ser humano a avistar o mais recente GRB. Se isso acontecer, prepare-se para a fama!


Referências:

Wikipedia. Gamma ray. https://en.wikipedia.org/wiki/Gamma_ray. Acessado em 16-Jan-2023.

2 Cherenkov Telescope Array. https://www.cta-observatory.org/. Acessado em 16-Jan-2023.

Wikipedia. X-ray. https://en.wikipedia.org/wiki/X-ray. Acessado em 16-Jan-2023

Giacconi, R & Rosati, P. (2008) Cosmic_X-ray_sources, Scholarpedia, 3(4):4391.

http://www.scholarpedia.org/article/Cosmic_X-ray_sources. Acessado em 16-Jan-2023.

5 Peter Mészáros (2008). Gamma ray bursts theory. Scholarpedia, 3(3):4337. http://www.scholarpedia.org/article/Gamma_ray_bursts_theory. Acessado em 16-Jan-2023.

6 Tytell, D. (2003). Amateur discovers gamma-ray burst afterglow. Sky & Telescope. https://skyandtelescope.org/astronomy-news/amateur-discovers-gamma-ray-burst-afterglow/. Acessado em 16-Jan-2023.

Pugliese, G. et al. (2005). The red optical afterglow of GRB 030725. A&A 439, 527–532. https://www.aanda.org/articles/aa/pdf/2005/32/aa2948-05.pdf. Acessado em 16-Jan-2023.

Astronomy Magazine (2008). Gamma-ray burst detected. https://astronomy.com/news/2008/04/gamma-ray-burst-detected. Acessado em 16-Jan-2023.

9 Beatty, J K. (2013) Brilliant GRB blastwith an amateur twist. Sky & Telescope. https://skyandtelescope.org/astronomy-news/brilliant-grb-blast-withanamateur-twist/. Acessado em 16-Jan-2023.

10 Dickinson, D. (2013). Amateur Astronomer Catches Record Setting Gamma-Ray Burst. Universe Today.

https://www.universetoday.com/102017/amateur-astronomer-catches-record-setting-gamma-ray-burst/. Acessado em 16-Jan-2023.

11 Wikipedia. GRB 221009A. https://en.wikipedia.org/wiki/GRB_221009A. Acessado em 16-Jan-2023.

12 Starr, M. (2022). Scientists Just Detected a Colossal Gamma-Ray Burst, And It's a Record-Breaker. Science Alert. https://www.sciencealert.com/scientists-just-detected-a-colossal-gamma-ray-burst-and-its-a-record-breaker. Acessado em 16-Jan-2023.

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